quinta-feira, 1 de março de 2012

Fevereiro de 2012 - Um marco na historia do Kanban

De fato, na minha visão, o mês de fevereiro transformou-se em um marco na vida do sistema Kanban. Infelizmente, também na minha visão, este é um marco negativo e vou contar aqui porque.

Infelizmente, na semana passada, o David Anderson, mentor do sistema Kanban, divulgou no fórum kanbandev uma iniciativa um tanto quanto perigosa. O David também escreveu sobre o assunto em sua página.

No fórum, questionei o David sobre a real necessidade de uma iniciativa como esta. Em suma, suas respostas se basearam em uma necessidade atual do mercado em ter uma forma de padronização e de atestar que o centro de treinamento é de qualidade no ensino do Kanban. Além disso, David informa que não é uma certificação end-user, isto é, apenas centros de treinamento serão certificados (vamos parar de enrolar e usar a palavra certa).

Ainda pior. Em uma das suas respostas, David dá a impressão de que uma nova "Alliance" está sendo formada. Vou linkar a mensagem, mas vou coloca-la aqui sob a forma de quote. Quem quiser o contexto inteiro, siga o link:
Alex,

This first move from LKU is designed to put some quality and trust into

training. If you don't want to be a trainer and work for a training firm but
would like some recognition in the community for your expertise what would you
like to see LKU do?

If we can find the right answers where there is a community consensus on what

other things LKU might offer then we can move forward.

The current LKU program developed out of conversations at the Kanban Leadership

Retreat in Reykjavik, Iceland last summer. I suspect that a good place to have
the discussion about the next phase would be at the Kanban Leadership Retreat in
Austria in June. As most of you know these are invitation only events. You have
to be leading an initiative at one or our clients, be an LKU member, or have
attended the 3-day advanced leadership and coaching workshop, or be someone we
know well and respect greatly in the community. The event is limited to 50
places and we still have space at the 2012 event.

There will be an LKU Advisory Board meeting at both the Boston LSSC12 conference

and the Leadership Retreat in Austria. If you can tell us what you want and
suggest ways of making it happen then we can take it under consideration.

Thanks

David
É senso comum na comunidade ágil que todas iniciativas centralizadoras são perigosas. E mais perigoso é não aprender com iniciativas passadas, ou do seu sistema ou de outros.

Agora vou descrever onde vejo que o perigo reside:

Primeiramente com relação à empresas, o CMMI se mostrou muito ineficiente. Não é culpa do CMMI, é culpa do conceito de "certificar". O grande problema é que empresas se mascaram com o nível de maturidade 5, por exemplo, durante a visita do avaliador. Quando acaba o período de avaliação, quase nada mais é seguido e o que é seguido, é feito de qualquer forma, onde não existem quaisquer preocupações com a qualidade dos detalhes. Por exemplo, é preciso ter um processo X onde vai gerar os artefatos Z e Y. Internamente, os artefatos Z e Y são gerados de qualquer forma, muitas vezes com ctrl+c e ctrl+v de outros artefatos. É, como no dito popular, para inglês ver.

Em segundo lugar, a certificação pessoal, ou end-user. O David, na kanbandev, escreveu que a iniciativa do Accredited Kanban Training program não está relacionada ao usuário final, ao praticante do Kanban. Mas em seu post, ele informa que uma iniciativa deste tipo já está sendo avaliada. Vejo que o Kanban começa a trilhar o caminho do Scrum, isto é, estão precisando (ninguém sabe porque) formar heróis. E como o Rodrigo Yoshima mencionou no twitter, pior que um falso herói, é um falso herói certificado.

Nas certificações pessoais, temos outro tipo de problema. O cara se preocupa em decorar alguns princípios (o suficiente para passar em uma prova) e, após passar, nunca mais se preocupa com aquilo. Outro problema é a certificação não atestar experiência no mercado (ou facilidade de resolver problemas lógicos ou facilidade em ser um team player que são, para mim hoje, qualidades superiores a ser um bom técnico) e, infelizmente, as empresas parecem não pensar desta forma, quando decidem contratar Scrum Masters (e agora parece que teremos algo semelhante no Kanban, como um Kanban Master) apenas Certified. Isso é uma temeridade. Um pedaço de papel não certifica que a pessoa saiba resolver problemas e tenha bom raciocínio em situações difíceis, ou até que tenha perfil para aquele trabalho. Esse pedaço de papel (alguns) só atestam que a pessoa sabe decorar e que tem algum conhecimento decorado sobre o assunto.

A vantagem de se trabalhar por tanto tempo em uma empresa grande é que lidamos com uma variedade grande de pessoas e a grande maioria (poderia chutar 90%) funciona dessa forma. Os outros 10% concorda comigo e diz que a certificação deles só serve para o mercado e não estão nem aí. O 90% que é incompentente valoriza demais o pedaço de papel.

Para não dizer que só reclamei, eu acredito em um modelo de certificação. Um modelo para pessoal e outro corporativo. O problema é que parece que são utopias, ainda mais porque a maioria dos vendedores de certificação estão mais preocupados com o dinheiro a receber que na preparação das pessoas e das empresas.

Para o modelo pessoal, eu acredito em um tipo de prova que solicite ao candidato que modele o mundo real. De fato construa uma solução, pense nas melhores possibilidades para resolver um problema. Consultas aos livros e à Internet estariam liberadas, já que o objetivo seria provar que o candidato sabe pensar e não que ele sabe decorar.

Para o modelo corporativo, bem mais complexo na minha visão, acho que a chave seriam avaliações mais regulares, trimestralmente ou até bimestral. Mas colocar isso em prática, eu concordo, seria algo complexo.

Sem esses modelos, na minha visão, só temos os problemas inerentes à certificação, isto é, pessoas incopententes com selo de competencia irreal.

Mas no que eu acredito? Eu acredito que o próprio mercado possa fazer essa peneira entre os bons e maus profissionais, boas ou más empresas, conforme falei para o David, nesta mesma thread na kanbandev. Profissionais e empresas incompetentes se auto-aniquilariam, se não tivessem o selo XPTO. Com os selos, estes incompetentes podem ganhar uma sobrevida.

Enfim, como também comentei na kanbandev, em outra thread, eu sou um cara técnico e gosto disso. Só estudo sistemas e métodos porque gosto de entender o mundo onde estou inserido e dar sugestões. Eu gosto da melhoria contínua, minha e do meu ambiente.

Outro ponto que analiso como positivo da minha personalidade e que minimiza (em mim) o impacto desta decisão do David e da LKU é que procuro ser pragmático em vez de dogmático. Estou fazendo estes comentários porque realmente me importo com os caminhos do Kanban, método que achei interessante e livre (pelo menos foi durante algum tempo). Entretanto, normalmente, prefiro misturar princípios e valores dos sistemas ágeis que conheço a adapta-los ao meu contexto, sempre com a bússola do Pensamento Lean para me guiar. Se criam desperdícios em um método/sistema, simplesmente passo a ignorar esta nova muda e seguir em frente.

Termino este post, com uma pergunta para o meu leitor refletir: Por que será que nunca surgiu uma certificação Lean (ou se surgiu, sua projeção foi tão irrisória que não fez diferença e o proprio mercado a destruiu)? Eu tenho uma teoria, mas gostaria de ouvir vocês.