quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Comando e Controle - Resquicio da Escravidão?

A grande motivação deste post foi um fato que presenciei recentemente. Há muito tempo estou querendo escrever algo sobre a forma Comando e Controle de gerenciar pessoas, principalmente pessoas que precisam usar sua criatividade para desenvolver um bom trabalho.



Como gosto de deixar claro, podem haver ambientes em que o comando e controle seja adequado. Felizmente não conheço estes ambientes na prática. O contexto aqui são trabalhos que exigem mais criatividade que atividade manual.

Como eu disse, recentemente presenciei algo que me deixou chateado. Precisei da ajuda de uma das pessoas que mais conhece sistemas unix-like no projeto. Quando sentei ao seu lado, havia uma janela do Firefox com uma dimensão de no máximo 80x40, aberta no Facebook. Esta janela não impediu a ajuda e, pelo que sei, não afeta a perfomance desta pessoa. O que me deixou chateado foi a necessidade de uma janela de browser tão pequena para checar algo tão inofensivo.

Uma das perguntas que surgem deste último paragrafo é "Se a perfomance estiver sendo afetada?"

Existem excelentes artigos espalhados em vários blogs na Internet, para citar alguns ninhos deste conhecimento, temos o Visão Ágil do Manoel Pimentel e o Débito Técnico do Rodrigo Yoshima. Algumas horas de pesquisas nestas fontes fornecerão as respostas necessárias a esta pergunta. Vou colocar a minha visão de forma resumida.

Partindo desta questão, sugiro outras duas, que na verdade são a base deste post: Será que a perfomance está sendo medida de forma correta? Será que o motivo da falta de perfomance é realmente a chamada navegação paralela?

Para nossa sorte, as famigeradas LoC (Lines of Code) como forma de medir a produtividade estão desaparecendo. Ainda devem existir casos isolados, mas com certeza são cada vez mais raros. Então como medir? Por valor entregue. O que é valor em desenvolvimento de software? Funcionalidades. Mas algumas funcionalidades são mais complexas que outras, como fazer? Pontuar. Com isso, hoje em dia, é comum mensurar perfomance com pontos. Entretanto, isso também é comando e controle. Perguntar algo do tipo: "Quantos pontos você entregou hoje?" me parece um controle tão grande quanto "Quantas linhas de código você entregou hoje?"

Então o que fazer? Acredito que a chave aqui seja sutileza e boa observação. Estas são duas características importantes de bons lideres. O líder deve notar desvios de produtividade sutis e, também sutilmente, encontrar a(s) causa(s). É de natureza técnica ou motivacional? A primeira é fácil de resolver. Investimento em bons treinamentos é a solução. A segunda é bem mais complexa, pois é essencialmente humana. Entretanto, existem técnicas e ferramentas que ajudam na detecção e solução destes casos. Mais uma vez, o Visão Ágil e o Agile Coach Professional (ACP) tem grande sucesso em mostrar como agir de forma eficiente.

Com isso, quero levantar uma questão ainda mais importante: Será que é realmente necessário medir perfomance? Será que em uma equipe auto-gerenciável isso não emergiria como um problema? Qual é a proposta? É  fácil para um líder que realmente está envolvido com a equipe perceber que alguém não está entregando e por isso não acredito ser necessário metrificar produtividade individual. Metrificar a entrega da equipe é importante, mas a entrega individual não.

Vamos agora examinar com mais detalhes a segunda questão.

Será que realmente é necessário controlar o acesso a Internet para aumentar a perfomance? Será que essa é a forma mais eficiente de resolver o problema da produtividade?

É lógico que não. Em primeiro lugar, qualquer estagiário consegue uma forma de burlar os mecanismos de segurança e acessar até sites adultos se quiser. Como as empresas 1.0 acham que solucionam isso? Normalmente com ameaças descabidas de que a utilização de mecanismos para burlar os bloqueios são ilegais e passíveis de justa causa. E a ameaça continua, dizendo que detectam isso facilmente.

Existem muitos problemas com essa abordagem.

Um deles é que, normalmente, empresas old school possuem heróis que são quase intocáveis. Estes "heróis" sabem de sua natureza intocável e não se importam com ameaças.

Outro problema, o maior deles na minha visão, é que com esta abordagem, a empresa 1.0 ataca o efeito e não a causa. Normalmente, procurar e atacar a causa exige treinamento e dedicação. E, infelizmente, os gerentes 1.0 procuram o caminho mais fácil, o comando e controle, tentando atacar o efeito. Quando não conseguem aplicar o comando e controle, fazem "vista grossa" com alguns membros da equipe o que desmotiva os não privilegiados e eis que surge o problema do ovo e da galinha.

Como quebrar este ciclo vicioso? Em primeiro lugar, os líderes precisam entender os liderados. Se faz necessário um trabalho longo de entendimento, envolvendo psicologia. Devem perceber que precisam ser agentes motivadores e também facilitadores. Devem liderar pelo exemplo e não pela mão-de-ferro. Devem atacar a causa e não o efeito. Se alguém não está sendo produtivo, não é culpa do facebook, twitter, youtube ou do jogo de paciência. Estes são efeitos de uma causa que deve ser investigada. E quando a causa for encontrada, deve ser trabalhada de forma inteligente. Aí reside a importância de um bom líder ser um bom coach, psicologo, mentor. É preciso entender a natureza humana e as causas que podem levar a um determinado comportamento.

Para finalizar, existem hoje os smartphones e tablets disponíveis no mercado a preços razoáveis e quase todo desenvolvedor tem pelo menos um dos dois (e a maioria os dois). Podemos incluir este como mais um motivo para classificar a abordagem de atacar o efeito e não a causa como ultrapassada e não inteligente.

Creio que isso responde as duas perguntas.

4 comentários:

  1. Esqueci de mencionar no post que o titulo foi uma contribuição do @rodrigoy e do @rcarneiro, via twitter. O @rodrigoy levantou a questão da escravidão, eu concordei e incorporei no título, inclusive com a imagem do chicote no início do post. Obrigado aos dois.

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  2. Ótimo post, meu amigo.

    Em minha visão:

    1) A questão do "comando & controle", por muitas vezes, deriva da lei do menor esforço do cérebro, ou seja, o cérebro humano gasta menos energia nas situações de "mandar" ou de ser "mandado", e isso acaba criando uma zona de conforto nas pessoas.

    2) Temos um grande gap de confiança nas relações humanas, isso faz com que sejam criados verdadeiros panópticos (http://en.wikipedia.org/wiki/Panopticism)nas organizações humanas em que vivemos.

    Abs,

    Manoel Pimentel
    @manoelp

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  3. Se a empresa precisa punir alguém por ver o Facebook é porque o trabalho nesta empresa deve ser tão ruim e tão desinteressante que talvez o profissional deva repensar se deve continuar lá.

    Marcelo Neves
    @marceloneves

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  4. @manoelp, concordo com o primeiro ponto. Mas ainda preciso refletir um pouco com relação ao segundo. Você trouxe pontos e conceitos novos para mim.

    @marceloneves, quero deixar claro que o fb foi um exemplo que, na verdade, me parece o mais comum. Foi mais uma ilustração. O ponto central não é o bloqueio de site A e B, mas sim o modelo de gestão que visa o comando e controle em detrimento da confiança e responsabilidade.

    abraços!

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