sábado, 9 de abril de 2011

Faculdades, certificações, concursos públicos e afins

Nesta semana, em um bate-papo descontraido em uma mesa de bar com alguns amigos, um assunto veio a tona, como sempre acontece quando estou com colegas de profissão: a eficiência, no Brasil, do ensino superior de informática em geral. A opinião foi unânime. A qualidade do nosso ensino de TI é precária, pública ou privada. Discordamos em como podemos nos mexer para contribuirmos para a melhoria dos profissionais. Neste momento a conversa em grupo se aproximou mais em um diálogo entre dois pontos de vista divergentes na mesa: A empresa de TI é o foco principal, então temos a mudança de dentro para fora e a mudança de fora para dentro.

A mudança de dentro para fora tem como objetivo provar com resultados que é possível ter bons profissionais não formados e que, muitos formados universitários, mesmo estagiando, possuem muitas deficiências. Este é o meu ponto de vista e, infelizmente, somente nele posso me aprofundar sem correr o risco de ser injusto.

Em primeiro lugar, as pessoas acreditam que sou contra a formação superior. Isso não é verdade. Eu sou contra a forma de ensino e contra o que é ensinado. Concluímos que não sou contra as faculdades/universidades em geral. Sou contra a qualquer curso, certificação, exame da CNH, OAB, torneio de curling que não faça o participante pensar.

Decorar é fácil. Simples assim. Estou me referindo a maioria das certificações.

Qualquer artista, por mais imbecil que seja, consegue decorar um texto. Ele não sabe falar direito, mas falar para a novela ele consegue. O motivo é evidente. Você consegue ensinar até um papagaio ou um cachorro, se você exercitar a repetição. O Bart Simpson decorou todos os planetas do sistema solar porque não queria ver o Skinner namorar com a Krabappel.

Bem isso é fato. Com este fato, creio que eliminamos a maioria das certificações. Testes multiplaescolha não provam nada. Provam que o candidato que conseguiu 99,87% sabe muito.... decorar. Infelizmente, a maioria, não aprendeu a pensar. E isso é fato também em concursos públicos, onde os candidatos se matriculam nos milhares de cursinhos espalhados pelo país para aprender......... os macetes. Desculpem a minha franqueza, mas isso é ridículo, na minha humilde opinião (IMHO).

Pegando esse gancho, vamos analisar os fins. Qual é a grande finalidade da pessoa que quer fazer um concurso público e quer passar por meio de macetes e decorebas. Estabilidade e bons salários.

Qual a grande finalidade da maioria das pessoas que entraram na faculdade com a bolha da internet no fim dos anos 90 e início dos anos 2000? Dinheiro. A maioria achava (e muitos continuam achando até hoje) que seria apenas se formar em TI que rapidamente estaria ganhando altos salários e o mercado estaria disputando seus serviços aos tapas.

Com essa visão dos seus alunos, as faculdades, principalmente as privadas, não tinham uma motivação para melhorar o que ensinavam. O fim das instituições é o dinheiro. Dos alunos, infelizmente é a realidade ainda hoje, é o dinheiro. Então para que mudar?

IMHO, o que precisa mudar é a finalidade. Maquiavel foi muito criticado. Mas, em parte foi mal interpretado. O fim essencialmente bom pode justificar os meios legítimos.

Mas qual seria um fim essencialmente bom neste caso? Sermos bons profissionais. Sermos bons médicos, bons advogados, bons engenheiros, bons designers de sistemas.

Assim, o que precisa mudar, no meu ponto de vista? As instituições precisam se preocupar em ensinar mais e melhor, tendo em mente que presta um serviço essencial ao desenvolvimento de um país.

Conheço muitos (mas muitos mesmo) formandos. Posso dizer que quase 100% deles nunca ouviu falar do livro do Meyer ou qualquer outro que aborde orientação a objetos de forma profunda. Quase todos que conheço saem da faculdade achando que encapsulamento é criar um método privado e um monte de getters e setters.

A culpa é dos formandos? Sim, em parte é. Um dos lemas da empresa onde atuo hoje é: Você é o responsável por sua carreira. Essa é uma das frases com as quais eu concordo. O formando, normalmente, sai da faculdade dizendo que precisa de um tempo de descanso do trabalho árduo que teve durante os 3 ou 4 anos de curso.

Pelo amor de Deus, descanso de que? Agora é que o jogo vai começar. Se precisa de um tempo de descanso agora, imagina quando começar o jogo? É preciso estudar e trabalhar, e só terá um mês de férias por ano por quase o resto da sua vida. Parte de suas férias será para ir a eventos, para assistir e conversar sobre novas tendências, trocar experiências, estudar.

Mas essa "bola é dividida". A responsabilidade das instituições é evidente. Precisam parar de ensinar coisas inúteis e passar ensinar o que é útil. Se o curso é para formar um analista/desenvolvedor, que ele seja o melhor desenvolvedor do mercado. Ensinem boas práticas, se atualizem com o mercado e realmente formem uma pessoa que vai necessitar "apenas" da experiência.

Se a faculdade não mostra o caminho, vamos procura-lo por forças próprias. Na era da informação, uma pessoa munida de boa vontade e uma conexão com a Internet aprende praticamente o que quiser. Então, por que fazer faculdade?

Vejo três motivos: pressão da família, a pessoa ainda dar credibilidade a esse ensino superior e pressão da empresa.

Bem, só é possível discutir agora a respeito do último: pressão da empresa. O primeiro é problema pessoal e o segundo tentei colocar meus pontos de vista até aqui.

Na minha opinião, as empresas precisam se atualizar quanto a forma de contratação. Para um cargo mais técnico, que um sênior de fato entreviste. Para fazer prova, que façam provas que mapeiem a realidade e que façam o candidato pensar sobre problemas reais. Não adianta aplicar uma multiplaescolha para uma pessoa certificada. No mínimo, decorar ela já provou que sabe.

Apesar de caber em um post, a mudança de cultura é muito complicada. Envolve todos no processo. Instituição, aluno/profissional e empresa. Mas hoje não tenho mais dúvidas de que essa mudança é necessária.

Espero que o ponto central deste post não tenha sido desvirtuado, mas se não fui claro, resumo o que acredito: Não é que eu acredite que todos que saem da faculdade/certificação sejam ruins. Mas o fato de uma pessoa ser formada e/ou certificada, não me garante que ela seja muito boa naquele assunto, quem dirá que seja um bom profissional.

4 comentários:

  1. Para melhorar a qualidade do conteúdo ensinado nas faculdades o melhor jeito seria criar um exame como o da OAB para se ter um mínimo de conhecimento obrigatório. Porém cairíamos em um clichê: exames de multipla escolha não comprovam o conhecimento. No entanto esta medida forçaria as instituições a terem um mínimo de conhecimento em suas ementas, trazendo com isso maior qualidade ao ensino e profissionais mais bem preparados para o mercado.

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  2. Obrigado pela sua participação!

    Pois é Rafael, concordo com você. Sou contra provas multiplaescolha, mas concordo que alguma coisa deve ser feita. Talvez esta prova quando sair da faculdade seja interessante. Sou a favor de provas que tentem mapear casos reais e faça o candidato resolver procurando a melhor forma possível. A qualidade do código da solução vai definir o nível que ele está.

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  3. 1. Prova e certificado não garantem nada. Isto é ponto pacífico, mas aí que entra a lógia fuzzy. Você pode dizer que uma pessoa formada em engenharia na USP é um bom engenheiro com 0,7 de certeza. Ou que alguém sem formação é um mau programador com 0,3 de certeza.

    É tudo uma questão de risco, e risco é um fator psicológico para o investidor, alguns gostam outros não. Neste caso, o investidor é a empresa que vai te contratar.

    2. A maioria das empresas que trabalham com tecnologia não tem interesse na mão de obra qualificada, desde que o trabalho seja feito.

    Claro que o mundo perfeito para elas seria que todo mundo fosse muito competente, assim a mão de obra qualificada seria abundante e barata. Mas, como a maioria das pessoas preferem ver faustão domingo do que ler um livro, portanto medíocres, as empresas preferem pagar pouco por imcompetentes do que muito para competentes.

    Isto parece contraditório ou contra-intuitivo, mas é fácil entender o porque isto ocorre: não se sabe medir o desperdício na área de TI, ou seja, não é possível calcular o custo da incompetência. Não temos métricas eficientes comprovadas, metodologias, nem pessoas qualificadas para fazer este trabalho. Alguém já ouviu falar em software certificado pelo IMETRO?

    Só seria interessante ter pessoas qualificadas se seu custo em termos de produtividade compensasse o custo dos menos qualificados. Como o custo do erro e desperdício fica debaixo do tapete das empresas, a balança sempre vai ser mais pesada para o lado quem é bom.

    sds,

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  4. Bad, o problema central no meu post e no seu comentário é que não repensam a TI como repensam o negócio. A área de TI é, muitas vezes, mais dinâmica que o próprio negócio.

    Uma metodologia que funcionava ontem, já não funciona hoje. Isso precisa ser avaliado e reavaliado. Quão rápido a sua empresa pode responder a uma mudança no mercado? E a uma mudança de TI? Quão Lean é a sua empresa? Como a sua cadeia de valores está sendo analisada? Como você está eliminando o que não traz valor para o seu produto?

    Com isso vamos para a outra questão. Qual a qualidade dos seus analistas? Você tem uma área de arquitetura que está constantemente avaliando o que acontece nas equipes?

    Se você compara ruim com ruim, não vai sair da zona de conforto. Tem que pensar fora da caixa. Como será que os caras que pensam a arquitetura de softwares agiriam nesta situação? O melhor desenvolvedor que conheço, como construiria esta solução?

    Com a Internet, estas informações estão disponíveis para quem tiver vontade. Veja projetos no GIT, blogs, slideshare, participe de eventos, converse com os melhores... basta vontade.

    E a contratação? Como eu disse, faça uma prova que realmente mapeie o mundo real. Talvez até alguns requisitos de uma demanda. Analise a solução do candidato. Como está a coesão das classes dele? Se preocupa realmente com acoplamento? Se sim, entra nos tres meses de experiencia. Nestes tres meses, analise as entregas do cara. Ele realmente se preocupa com a qualidade do trabalho? Observe o que ele diz no dia a dia sobre desenvolvimento. Tem interesse em aprender outras linguagens, participa de fóruns, comunidades..

    Existe alternativa, mas para que tentar se posso insistir no modelo atual e continuar colocando a culpa em outras coisas? Old School x New School... Pensamento 1.0 x Pensamento 2.0..

    Como eu disse, é só querer.. o resto é fácil.

    Abraços

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